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Vozes Locais, conexões políticas: o papel dos presidentes de bairro como brokers políticos

Guilherme de Abreu Duque


Problemas de iluminação, buracos no chão, asfaltamento, saneamento básico e transporte público são questões que perpassam a dinâmica de diversas cidades brasileiras e no mundo, criando inúmeros transtornos para a vida de seus moradores. Quando problemas como esses surgem, a população tem algumas alternativas para tentar resolvê-los, uma delas é acionar as associações de moradores e seu presidente, às vezes conhecido como presidente de bairro.


Tendo se popularizado na metade do século XX, as associações de bairro, entidades de direito privado sem fins lucrativos, são organizações comunitárias formadas por habitantes de um bairro ou região para representar seus interesses coletivos. Elas podem atuar como intermediárias entre a população e os órgãos de governo, buscando melhorias para a infraestrutura do bairro e a resolução de problemas que atingem a localidade. Os presidentes de bairro têm a função de representar a associação, mobilizar a população, promover reuniões e pensar estratégias para promover melhorias.


A pesquisa "Vozes locais, conexões políticas: o papel dos presidentes de bairro como brokers políticos", desenvolvida no PPGCSO/UFJF, teve como objetivo compreender em que medida os presidentes de associações de moradores atuam na intermediação das relações entre eleitores e políticos locais. Em outras palavras, a pesquisa investiga se os presidentes atuam como brokers - também chamados de mediadores ou operadores políticos - intermediando a relação entre a localidade e um político ou candidato, conquistando benefícios para a primeira e votos para o segundo. 


O estudo se baseou em uma abordagem mista que incluiu: (i) um survey com presidentes de associação de bairro de 56 municípios de todas as regiões do Brasil, com 150 respondentes; (ii) um grupo focal com presidentes de associações de bairro em atuação em Juiz de Fora, município da Zona da Mata mineira com 540.000 habitantes; e (iii) entrevistas em profundidade com presidentes de associação de bairros periféricos da cidade. 


Os dados do survey mostraram que a maioria dos presidentes possuía as características associadas aos brokers: tempo considerável de residência no bairro, que se traduz em penetração e conhecimento da e na comunidade, perfil de liderança e capacidade de mobilização de votos. Eles podem ser considerados mediadores em potencial, mas sua atuação varia em intensidade e duração. Nem todos os participantes do grupo focal e das entrevistas em profundidade mantinham conexões sustentadas com políticos ou partidos. Dentre os participantes da etapa qualitativa, eram poucos os que se encaixavam na imagem típica de um broker engajado em trocas políticas envolvendo apoio eleitoral, de um lado, e canalização de benefícios, por outro. Mesmo assim, vários deles foram taxativos sobre a relevância dos vínculos com políticos para a canalização de benefícios para a localidade.


Possui vínculo com políticos e/ou partidos x Capacidade de conseguir votos se declarasse apoio a um candidato(%)

Fonte: Elaboração própria com base em dados do NEPOL/UFJF
Fonte: Elaboração própria com base em dados do NEPOL/UFJF

Os presidentes de associações utilizam múltiplas estratégias para resolver problemas comunitários, como acionar contatos na administração municipal, mobilizar a participação popular, utilizar a mídia para dar visibilidade às demandas e recorrer a mecanismos formais, como aplicativos de gestão municipal. No entanto, a falta de engajamento da comunidade foi apontada como um obstáculo para a obtenção de melhorias, reduzindo a eficácia das associações.


Outro achado importante foi a ausência de referências aos partidos políticos como fonte de apoio, mesmo entre os presidentes filiados a partidos, o que sugere que a mediação ocorre mais entre indivíduos do que entre instituições. Para denominar os mediadores que não possuem vínculos com partidos e organizações, mas se relacionam com políticos individuais, apresentei a categoria de broker nominal. Até então a literatura vinha considerando esses indivíduos como atores independentes, sem considerar que vínculos entre pessoas também podem gerar constrangimentos ao comportamento.


Enquanto alguns participantes do grupo e das entrevistas consideram que a mobilização popular e o uso da mídia garantem maior autonomia em relação aos políticos e candidatos, outros acreditam que as conexões políticas são fundamentais para viabilizar projetos e demandas locais. A pesquisa também demonstrou que a frustração com os políticos pode levar à descontinuidade das relações de mediação. Em alguns casos, presidentes abandonam alianças políticas devido à falta de resultados concretos, enquanto outros buscam novas formas de mobilização social e estratégias contenciosas. Assim, os achados reforçam o argumento já explorado em outros estudos de que mediação política e ativismo comunitário não são dinâmicas opostas, mas complementares. A ação coletiva pode tanto atrair políticos interessados em apoio eleitoral quanto impulsionar projetos comunitários independentes. Neste sentido, a relação entre políticos e presidentes de bairro pode ser influenciada pelo desempenho dos brokers, uma vez que os políticos avaliam sua capacidade de mobilização e entrega de votos antes de investir nesses intermediários.




Guilherme de Abreu Duque é cientista social, mestre em Ciências Sociais e doutorando em Ciência Política no IESP-UERJ. Para a realização de sua pesquisa, orientada pela Profa. Marta Mendes da Rocha, contou com apoio da CAPES e do CNPq.

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